quarta-feira, 7 de setembro de 2011
Le temps de sauvages noirs
Os cães uivaram no mata e a porta da cozinha sempre aberta, junto com eles, seu grito de aviso que estava por chegar. As portas da minha casa sempre ficam abertas para os cães, os estimo, mas nunca os faço de “estimação”. Desta animosa feitura que os homens compõem como carinho e cuidado, para ter dentro de suas casas, no seu presumido cuidado e zelo; meus animais são libertos, livres como eu sou também, não me quero donos deles, nem muito menos donos de mim, numa fastidiosa e consumida relação de precárias côrtes e desejos cobrados, nunca cumpridos.
Os cães uivaram na mata que dava para a porta da cozinha, as vidraças quebradas, deixando rombos antigos de pedradas altaneiras de meninos, recém descobertos, punheteiros envergonhados de si, querendo e precisando demarcar suas fúrias e vontades molestadas em si mesmas, pelas culpas e segregadas ações, muito primeiramente atávicas, munidas de uma educação que não me compete aqui discutir_ não sou pedagogo! Não sou professor! Não sou o que os títulos enobrecem! E muito pior interessa a tarefa de ser pai desses meninos, que rompem a mata de volta à suas casas, cuspindo insistentemente nos caminhos e trilhas, nunca escondidas, mas cheia de mistérios bons, da salivada boca do gosto do meu pau, a desmesura que em poucas horas antecedidas, a eles próprios, era de todo prazer.
Os cães uivaram e ele gritou seu uivo junto com eles, posto que sua feitura fosse toda, de arrimados músculos não mais adolescentes, embora de púberes cortes, fosse todo o entalhe do seu corpo nu. Não me acometia nenhum susto, fui batizado nas igrejas mais pagãs e tortas pelos pais mais certos e convencidos de que, talvez, eu viesse a ser a riqueza da família. Enriqueci, todo amparado por coléricas profissões que não me convém aqui dizer, não me interessam também estes nomes, estes títulos, vá que eu possa ser um médico, um doutor, o cardiologista da sua família ou quem sabe um renomado figurão de encarregados postulados civis?! Deixa então que eu gargalhe, porque nenhuma dessas é a minha profissão, não sou nenhum novo rico, sou apenas pornógrafo, sou apenas a pena de mim mesmo e dos que me fogem com medo de depois da festa de pequeninas luzes e intenções.
Preciso tomar um banho e não paro por nada minhas arraigadas e arrogantes minúcias, para receber ninguém, por isso deixo sempre a porta aberta, correndo sim, eu sei, o larápio risco dos ladrões e malfeitores, que não me conhecem sequer a capacidade de ser maldito, de ser esperto ou medroso; do medo, só sei quando me deparo emocionalmente com ele, porque do físico nada mais me atormenta nos tempos infernais de hoje.
Disponho de certeza quando sinto o cheiro do presente corpo acalmando antes aos cães e enquanto dispo parte a parte das minhas roupas, imagino que ele está de quatro, porque tem o dom de estar, assim como eles, latindo ou rosnando, palavração sublime e endomoniada de uma invejável soltura e beleza, quando a espinha se distende numa curva e sinuosa estrada para dar vantagem as suas ancas, já por mim constatadas e me excito. Nessa hora sei quem vem. Quem entra a porta da cozinha abrindo primeiro sem rudeza nenhuma, sabendo já não mais me fazer surpresa alguma, para ganhar, descalço, pés de negro que se confundem com as rachaduras da terra, até chegar a porta do meu banheiro e me dizer:
__Senhor, posso entrar?
__Na banheira?_ e porque de mim nascera bom sorriso, a cabeça do meu pau em eriço, esquentando cada vez mais doçuras, levemente produzindo verniz de suntuosas doçuras dentro da água de banho_ Mas primeiro lave os pés, que você assim me faz achar que estamos num rio e quero você primeiro em condição igual a minha! Porque não me chegaras antes? Assim era corpo sujo, dado a corpo sujo, cheiro azedo, dado a corpo azedo, ao copo da boca, sem as frescuras do perfume de flor e cinza dos sabonetes lustrosos! Por quê?
Lavou, mas que rápido os pés na pia rosa do banheiro e eu ainda disse para que tomasse cuidado para não escorregar no chão que ficaria molhado, para que não batesse ou debatesse a cabeça no azulejo frio sem motivo que a ele fosse bom. E porque a água estava quente e nem um frio lá fora, para ele sem camisa, apenas com as calças do trabalho, quase estivador, não fez pressa em me perguntar quase servil, se preferia que ele próprio tirasse o restante da roupa ou se eu o preferia fazer, emprestando “levítica” doçura de ritos primaveris e sempre constantes na anunciação do que para ele já seria sexo.
__Deposita primeiro o pé, um de cada vez, para sentir que no fundo do rio já existe um corpo, felicitado._ Eu ri!_ Porque hoje ele também quer o corpo teu. Depois com o outro pé, busca na banheira uma parte que te dê segurança e escolhe o ângulo certo para assentar tuas ancas sobre esta parte que é toda tua nesta hora! Faz assim, de um jeito sacramentado, faz que eu ficarei feliz!
__Gosto de ver o senhor sorrindo, gosto! Gosto tanto, sabia?
__Não sabia não! Você nunca me disse, mas pode dizer isso enquanto senta, diz! Diz então que gosta de me ver sorrindo e me empresta a tua paz enquanto senta e gorjeia teus lamentos e cânticos profanos, santos do mato te trouxeram aqui eu sei! Demônios da mata de soslaio te fizeram lembrar de mim neste fim de tarde fria.
__Mas não estava frio lá fora senhor! Eu estava no chão com os cavalos, corri pelos campos, brinquei com as crianças e depois resolvi que queria vir aqui para brincar com o senhor, que sempre é bom de um todo para mim! Amo o senhor sabia?
__Acho que sim, porque também sinto amor quando vejo que você vem de bom grado a minha casa, que você não se prende em amarras e nem deixa de ser para as outras pessoas, para as tuas meninas, tuas promessas de casamento, sem jamais me esquecer! E me desculpe se pareço pretensioso!_Enrubesci de mentiras e verdades cruzadas dentro de mim, porque sou feito de prazer também igual, quando encontro alma justa, que me mereça.
__Não tem que ter dúvida disso não, não senhor!Não te dou motivos para isso, dou?
__Dá, para mim, somente agora, o que me quiseres dar e daí eu terei certeza! E não faz muito tempo nas paragens nessa minha elegia de pequenas e falsas aras, porque eu quero mesmo é que sentes todo no que você tanto gosta de sentir entrando em ti. Dá?
E feito dessa tonsura, dessa tontura, ele que era corajoso e decidido, vinha macio e franzido o cenho, a testa, o pescoço revirando o imenso pomo de Adão para trás, pelos músculos também muito bons de morder, do seu pescoço de negro moço, enquanto encaixava sem nenhum problema de transformar a pequena dor em prazer, em momentos esparsos e dançantes, como o lundu de tribos antigas, como o aluno se dava ao professor na esperança de jorrada sabedoria dentro de si. E meus cabelos eram tocados por suas mãos toscas, grossas, meigas de calos e de esporas, eram puxados meus cabelos e o centro do meu corpo, o meu ventre e meu peito para junto de si, para a sua boca de carne negra e gorda, lábio gordo, encharcado da pólvora da poeira dos cascos de um cavalo de tropel nada macio, resfolegado e febril. Vibrante e febril, trêmulo e jamais cansado de galopar e correr as matas viris do meu colo branco, minha virilha de algas flutuantes. E como era bom, eu preciso dizer! Como era bom me sentir amado sem pressa, sem mesclas de covardia ou medo, porque quem tem a boca cheia de fogo ou queima a língua ou cospe fogo! Ou teima á míngua ou faz o jogo certo de sua natureza, toda própria de obediências boas, sem pecado! Sem o peso cristão do pecado, ele era meu e eu era dele, sem nenhum medo ou sino que nos depusesse segredo ruim! Porque quando eu entrava nele, tenho certeza que os dois, dávamos bela, a presença e a certeza da companhia de Deus entre nossos orgasmos e mágoas da vida, trespassada, pela excelência grandiosa de não termos razão para fugir de nada e que àquela hora, era somente nossa e de Deus, espalhado na figura de mil outros deuses e cães e bichos todos outros espalhados no alarido misterioso da mata, da floresta de todo o mundo.
Ele, talvez tenha sido até hoje o único homem para quem eu tenha me dado em constância de tranqüilidades e nenhuma grande necessidade de placebos. O meu verbo era feito no silêncio e sem nenhuma escola de maestria, porque ele era todo bicho, era capaz de ouvir. Assim como os cães libertos soltos, do mato, que protegem e governam a mata e por generosidade, também os arredores de minha casa.
O pornógrafo
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Texto magnífico, fluido, uma obra literária. Gostei muito. Bem narrado e maduro. Quando virá um livro?
ResponderExcluirQuando leio seus textos tudo vira poesia...
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